O feminicídio na prática

Há três meses escrevemos aqui o artigo “O feminicídio como conduta punitiva”, dado que em 09 de março desse ano foi sancionada e entrou em vigor a lei nº 13.104, que alterou o art. 121 do Código Penal para nele incluir o “feminicídio” como qualificadora, entendido assim como a morte da mulher em razão do gênero. Note-se que a nova qualificadora está contextualizada numa relação de poder e submissão e no estado de vulnerabilidade da mulher vítima do homicídio, podendo ser praticado tanto por homem quanto por mulher. Na ocasião, tecemos algumas críticas à implementação da nova lei, visto que sabemos de vivência no tribunal do júri que tal comportamento já era contemplado antes do acréscimo do inciso pelas qualificadoras da torpeza ou motivação fútil, a depender de cada caso concreto. A mudança, como já ensaia a doutrina, teria sido tão só topográfica, diria mesmo cosmética, com o objetivo mais de chamar a atenção da sociedade para a violência praticada contra a mulher do que propriamente evidenciar uma grande mudança na implementação legislativa. Tanto que a pena é a mesma incidente às qualificadoras referenciadas. Não obstante já termos focalizado o tema quanto ao aspecto teórico da lei, voltamos ao mesmo em face da denúncia ofertada pelo Ministério Público na última sexta-feira, a primeira em Teresina com a etiqueta da condição do sexo feminino, cuja a vítima é a menor de 15 anos de idade Aniele Magalhães da Silva, morta pelo namorado no dia 22 de maio próximo, com um tiro na nuca, pelo simples fato de ter rompido o namoro com o autor do fato.

Vê-se assim que no campo prático, iremos sentir pela primeira vez o posicionamento da justiça estadual no tocante a esse novo dispositivo. Como já salientado, não é de fácil caracterização o seu enquadramento, haja vista que o comportamento do criminoso pode ser albergado por outro inciso do mesmo parágrafo, mas é preciso provocar o Poder Judiciário no sentido de amoldar a conduta do agente à norma estabelecida na figura penal. No caso denunciado aqui em Teresina pelo Ministério Público, ficou salientado na denúncia que a vítima menor era constantemente ameaçada e agredida pelo autor do fato delituoso que resultou em sua morte, tendo este sido movido por convicção de posse em relação a mesma, demostrando um menosprezo a sua decisão de pôr fim ao romance existente entre ambos. Isso por si só a colocava numa situação de vulnerabilidade, o que demonstra a juízo da promotoria perfeita consonância com o estabelecido pela norma legal.

O que há de ser entendido é que o Ministério Público, ao sair na frente para colocar em discussão na pauta do júri essa questão da violência praticada contra a mulher, abre espaço para que a Lei 13.104, de 09 de março último, tão alardeada em todo país como mais um instrumento eficaz de defesa da causa, seja posta à prova e se ver se realmente ela veio para ficar, como se diz costumeiramente, encontrando eco nos tribunais, ou se é tão só mais um instrumento midiático e político.

Comente aqui