A Suprema Corte americana e o casamento gay

Na sexta-feira, dia 26, uma decisão da Suprema Corte americana surpreendeu o mundo ao decidir por cinco votos a quatro aprovar o casamento gay no país. Isso significa que todos os 50 estados americanos ficam submetidos à decisão da mais alta corte da nação, não podendo, por conseguinte, se contrapor ao enlace matrimonial civil entre pessoas do mesmo sexo, o que naturalmente é uma grande conquista para o movimento pelos direitos homossexuais no país, e no mundo, principalmente levando-se em conta que é uma luta que se arrasta praticamente há meio século em território americano. E mais! Trata-se de uma sociedade extremamente conservadora. A Casa Branca logo a noite ficou reluzente com as cores da bandeira que representa as minorias sexuais. O presidente Barak Obama, se pronunciou após a decisão e afirmou que aquilo representava “uma vitória para a América”. No twitter disse: “Casais de gays e lésbicas têm agora o direito de se casar, como todas as outras pessoas”. O vice-presidente americano Joe Biden, desde 2012 já se manifestava favorável e foi a primeira autoridade do alto escalão no governo a apoiar o casamento entre pessoas do mesmo sexo. A pré-candidata à presidência dos Estados Unidos, Hillary Clinton, também comemorou a decisão em seu perfil na rede social. Em várias partes do mundo, cidadãos que fazem parte do movimento e simpatizantes manifestaram-se, de alguma forma, saudando a decisão americana, quase que com um sentimento de que o que vale para a América, vale para o mundo, parafraseando um estadista americano.

Ao analisar o apertado resultado que permitiu a partir de agora o casamento gay no território americano, evidenciando a mesma dignidade perante a lei da qual usufruem os casais heterossexuais, observa-se que a Suprema Corte – de natureza conservadora e relutante - sofreu influência repentina da opinião pública e veio a reboque de um movimento civil organizado a partir dos anos 60, que foi ganhando espaço e se fortalecendo nos últimos vinte anos à medida que assimetricamente ia-se quebrando no seio da sociedade americana o gelo da discriminação. Tal movimento de pressão e mudança, também atingiu o executivo. Basta lembrar que, em levantamento realizado pelo instituto Galup realizada em maio último, 60% dos americanos apoiavam o casamento entre pessoas do mesmo sexo, contra 55% em 2014 e 27% em 1996. Então aqui vale o registro, extraído da visão do jornalista Michael Kepp, americano radicado no Brasil que bem conhece a realidade americana, não foi a visão dos cinco juízes mais conservadores que evoluiu rapidamente, contudo bastou que um deles, o juiz Anthony Kennedy, católico de origem irlandesa se deixasse influenciar, primeiro pelo fato de 36 Estados norte-americanos, até 2011, adotarem o casamento gay, mas também em razão da católica Irlanda, agora no mês de maio último, ter referendado a mudança na Constituição do país para estender o direito ao casamento às pessoas do mesmo sexo.

No Brasil, o maior país católico do mundo, inobstante dizer o texto constitucional ser o Estado laico, apesar dos avanços, ainda se registra no cotidiano um acentuado grau de discriminação em relação a causa. Some-se a isso o reforço das diferentes igrejas. Os ventos que sopraram do nosso vizinho, a Argentina, mesmo que sob um cerrado movimento contrário da igreja católica, que viu aprovado pelo Senado, em julho de 2010, o casamento gay, sendo assim o primeiro país latino-americano a reconhecê-lo, não deixou de contagiar o Judiciário brasileiro. Tanto assim que, em decisão de 2011, o STF estendeu o estabelecido no artigo 1.723 do Código Civil, ou seja, a união estável heterossexual como entidade familiar, aos casais gays. E nela atribuiu efeito vinculante. Portanto, esses casais desfrutam de direitos semelhantes aos de pares heterossexuais, tais como pensões, aposentadorias e inclusão em planos de saúde. Ademais, dois anos depois do decidido pelo Supremo Tribunal Federal, o Conselho Nacional de Justiça estabeleceu que os cartórios brasileiros fossem obrigados a celebrar casamento entre pessoas do mesmo sexo, e não poderiam se recusar a converter a união estável homoafetiva em casamento. Sabe-se que na prática ainda há um longo caminho a percorrer para que a discriminação seja uma prática banida, dado que o país, eminentemente conservador quanto ao tema, se mostra muito dividido, assim como o resultado proclamado pela Suprema Corte americana. Mas como se trata do maior e mais importante país do mundo, só nos resta saber se o que é bom para os Estados Unidos é bom para o Brasil, e é bom para o mundo.

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