EM JUNHO DESTE ANO, JUSTIÇA RECEBEU DENÚNCIA CONTRA ESQUEMA ACUSADO DE CRIMES CONTRA O ESTADO NA REGIÃO SUL DO PIAUÍ
Em maio deste ano, o governador do Piauí Wellington Dias (PT) nomeou a advogada Adriana Saraiva de Sá para exercer o cargo de diretora da Unidade de Fiscalização e Licenciamento da Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Semar). A nomeação não chamaria atenção se Adriana não fosse alvo de uma ação penal onde responde pelos crimes de associação criminosa, falsidade ideológica e dispensa indevida de licitação.
A ação penal é resultado de uma denúncia do Grupo Especial de Regularização e Combate à Grilagem do Ministério Público do Estado do Piauí (MP-PI). Em meados de 2010, Adriana era procuradora autárquica do Instituto de Terras do Piauí (Interpi) e forjou pareceres favoráveis à expedição de títulos de terras públicas para supostos trabalhadores rurais, quando na verdade o objetivo era repassar à propriedade para a uma família de sobrenome Rampelotti. Ao todo, 11 pessoas são alvo da ação penal.
O ex-governador Wilson Martins (PSB), que segundo o MP-PI foi levado a erro pelo grupo, é testemunha no caso. O esquema tinha como objetivo "legalizar" a transferência das terras do Estado para terceiros. Para isso, foram usadas 61 famílias de supostos trabalhadores rurais que, na verdade, nunca foram beneficiados. Em tese, essas famílias ganharam a posse da terras do Estado e depois venderam para os Rampelotti, o que na prática foi tudo forjado.
As investigações constataram que os Rampelotti já tinham invadido as terras bem antes. A transferência dos títulos para os trabalhadores rurais foi feita com o intuito de "construir a legalidade" para posterior aquisição das terras pela família. Os trabalhadores, que nunca foram beneficiados, em seguida "venderam" as terras para os Rampelotti. Adriana, à época no Interpi, forjou a legalidade, segundo o MP. Até um falecido foi usado no esquema.
A fraude foi bem organizada. Um presidente de sindicato rural usou trabalhadores para coletar documentos, fingir posse das terras e depois passá-las aos interessados. O então presidente do Interpi, Luis Ribeiro, permitiu que todos os processos de regularização ficassem sob o comando de Adriana Saraiva. Eles levaram o então governador Wilson Martins ao erro, fazendo com que Wilson assinasse atos de concessão com legalidade forjada.
Um processo de dispensa de licitação também foi feito de forma ilegal. Segundo o MP-PI, Adriana Saraiva de Sá atuou indevidamente no sentido de dar formalidade à dispensa, cujo objetivo também era assegurar a venda de terras por valor irrisório para a família Rampelotti. A denúncia contra Adriana e os outros 10 envolvidos no esquema foi recebida em junho deste ano pelo juiz Anderson Brito da Mata, da Vara Única da Comarca de Ribeiro Gonçalves.
Mesmo diante das acusações, Adriana ocupa desde maio um cargo relevante na Semar. Ela cuida justamente de um setor delicado, o de fiscalização e emissão de licenças ambientais.
Para se ter ideia da delicadeza do cargo, em 2018 servidores da Semar-PI foram presos numa operação da Polícia Civil suspeitos de vários crimes, entre eles a emissão ilegal de licenças ambientais. Os suspeitos foram denunciados pelo MP e também respondem ação penal.
Cabe destacar que não é ilegal nomear pessoas que sejam rés em ações penais, mas no Piauí parece ser muito comum a falta de receio dos governantes na hora de fazer nomeações nessas condições. Adriana foi denunciada e virou ré numa ação onde o Estado foi vítima.
Vale apontar ainda que o escritório de advogacia de Adriana Saraiva, localizado na Zona Leste de Teresina, também milita, entre outras, nas áreas agrária e ambiental.
O Política Dinâmica procurou o Ministério Público do Piauí (MP-PI). Um dos promotores que atuam no caso foi contactado, mas não quis comentar sobre o fato de Adriana ter sido nomeada para cuidar de licenças ambientais na Semar. Ao todo, quatro promotores de justiça assinaram a denúncia que resultou na abertura da ação penal contra os 11 réus.
A reportagem também procurou a assessoria de imprensa da Semar para saber se o órgão e a própria Adriana queriam se manifestar. A assessoria ficou de encaminhar a demanda e um dia depois passou o contato da própria Adriana para a reportagem contactá-la. Ligações foram feitas para o número repassado, mas nenhuma delas foi atendida.
O Política Dinâmica voltou a acionar a assessoria e informou que as ligações não foram atendidas, mas a própria assessoria não estabeleceu mais nenhum diálogo sobre o tema.