"GOVERNO BOLSONARO É MOVIDO POR POLÍTICA", DIZ FÁBIO SÉRVIO

Fábio Sérvio disputou governo do PI em 2018 (Foto: Jailson Soares/PoliticaDinamica.com)

Ele foi candidato a governador do Piauí pelo PSL em 2018. Quando todos os políticos tradicionais do Estado faziam chacota da candidatura de Jair Bolsonaro, ele defendia o nome do capitão. Protagonizou embates em programas de TV, comprou briga com poderosos, exibiu uma camisa com a foto de Bolsonaro em um debate de televisão e ao final da eleição teve mais de 63 mil votos, ficando na quarta colocação na primeira eleição que disputou em sua vida.

Com a vitória de Bolsonaro, muita gente alimentou a ideia de que Fábio Sérvio, hoje filiado ao PROS, pudesse ter algum espaço da gestão do capitão, fosse em Brasília ou mesmo no Piauí. Não teve. Ainda em 2019 ele deixou o PSL, mas se manteve como apoiador do governo federal que ajudou a eleger. Após um ano e quatro meses do governo Bolsonaro, Sérvio resolveu quebrar o silêncio e falou sobre a forma como o presidente está conduzindo o país. 

Fazendo analogia com a matemática, Sérvio disse que o governo federal ainda não tem função constante, não é reto. Segundo ele, a gestão bolsonarista é movida por política. Ele reconhece que existem quadros técnicos, mas avalia que a ideologia política ocupa espaço majoritário. 

Fábio Sérvio ainda falou sobre a saída de Sergio Moro, ícone dos bolsonaristas até duas semanas atrás. Ele disse que já esperava a demissão do ex-juiz desde o ano passado. Para Sérvio, é preciso entender a essência do Governo, quem e o que influencia as decisões de Bolsonaro e em que nível de ponderações ocorrem essas discussões. Ele afirma que não vê Sérgio Moro com desconfiança e que não vai apagar da memória a história dele como juiz e tudo que ele fez. Além disso, condena os ataques a Moro.

CONFIRA A ENTREVISTA

PD - Como você tem visto o atual momento do Governo Federal?

FS - Em matemática, uma função constante é uma função cujo valor é o mesmo para todos os valores de entrada. Fazendo uma analogia com a matemática, o Governo Federal ainda não tem uma função constante. O governo ainda não é reto. Os elementos que fazem parte do Governo Federal, com algumas exceções como o ministro Tarcísio Freitas, a ministra Damares Alves, o agora Ministro da Justiça Alexandre Mendonça e os ministros oriundos das Forças Armadas, todos os outros não representam 100% a imagem do próprio Bolsonaro, que é a do próprio governo. Por isso os seus resultados divergem, criando situações como as vividas pelo Sérgio Moro, Mandetta, Santos Cruz e alguns outros que já deixaram o governo, e outros que porventura deixarão, como parece ser agora, o caso da Regina Duarte.

O corpo do governo federal é, como todo outro, movido por política. Por mais que o critério técnico seja colocado como fator principal, não se dissocia isso da ideologia política. Tarcísio Freitas tem uma formação militar, foi referendado por alguém de confiança de Bolsonaro, o deputado federal Victor Hugo, que também é militar. Damares e Alexandre Mendonça são evangélicos, defendem pautas políticas no costume que fazem parte da ideologia política do Governo definida pelo presidente da República, por mais técnicos que fossem, sem isso, não teriam estabilidade. Os ministros militares, claro, podem não ter uma completa afinação ideológica, mas têm uma mesma formação com o Bolsonaro. Mas entre a ideologia política e a farda, Bolsonaro escolhe a primeira, como foi o caso do Santos Cruz.

É difícil avaliar o governo federal. Entendo que ele, decorridos, como você disse, uma ano e quatro meses, ainda está em formação. E nós não sabemos o que irá se tornar.

Sérvio durante debate eleitoral na TV (Foto: Reprodução/Facebook)

PD - Como viu a saída de Moro?

FS - Eu já esperava a saída do ministro Sérgio Moro desde o ano passado. Como sabia que ocorreria a saída do Bebianno, do general Santos Cruz, do general Maynard Santa Rosa, do Mandetta e da líder do governo Joice Hasselmann. É preciso entender a essência do Governo, quem e o que influencia as decisões do chefe do executivo e em que nível de ponderações ocorrem essas discussões. Partindo do princípio, Bolsonaro tinha um núcleo muito pequeno no seu gabinete de pessoas de sua confiança há décadas, número esse insuficiente para montar uma equipe de campanha, de elaboração de um plano de governo, e a própria equipe de governo. Era o ambiente de convívio muito íntimo, difícil de aceitar pessoas de fora desse círculo. Santos Cruz, General Ramos, e general Heleno e o próprio Mourão têm juntos uma passada, um elo no passado que os liga ao Bolsonaro, além da farda, o fato de terem sido vizinhos na vila militar no Rio de Janeiro. Bolsonaro recorreu a esses elos, alguns ideológicos, outros de farda, outros de amizade para montar o seu governo. Mas nenhum desses elos supera a influência do círculo íntimo originário do gabinete do antes deputado Bolsonaro e o da sua família. Quem já caiu é porque não fazia parte desse círculo. 

PD - Ao longo de um ano e quatro meses, já saíram pintados como traidores Gustavo Bebianno, general Santos Cruz, Luiz Henrique Mandetta, Joice Hasselmann e agoro Moro. Como você avalia tudo isso?

FS - Não tenho procuração para defender nenhum deles, nem tenho procuração para acusar ninguém em nome do Presidente da República ou mesmo defender o Bolsonaro. Posso falar do que convivi e do que eu vi. Bebianno, eu tive apenas dois encontros rápidos com ele, nunca troquei um telefonema, mas sei que era o homem que levava a campanha do presidente nas costas. Foi reconhecido ao ponto de se tornar ministro. O que levou sua queda? Nunca foi esclarecido com transparência. Sobre o general Santos Cruz, sua carreira no Exército foi uma das mais promissoras, com reconhecimento internacional. Indiscutível seu preparo. Tive poucos encontros com ele e no final do ano passado nos falamos de forma cortês e trocamos mensagens de Natal. Tenho uma admiração pessoal por ele. Como ministro, estava no início de seus trabalhos, e sob meu ponto de vista, conduzindo muito bem. Começou a ser atacado nas redes sociais e foi exonerado do cargo, até hoje, nunca foi esclarecido com transparência o por quê de sua saída.

Mandetta eu não tive nenhuma convivência. O cumprimentei uma vez na transição quando a Adriana Sousa me apresentou a ele. Como brasileiro, não tenho ressalvas a seu trabalho. Joice Hasselmann sempre foi uma ferrenha defensora do governo federal, do próprio presidente da República. Sei que tudo que fez, e a forma que conduziu as relações com o Congresso, foi seguindo orientação do Palácio do Planalto. Comigo, em todos os momentos, agiu de forma republicana e tentou de todas as formas, desde o início ajudar o Piauí. É indigno a forma como foi atacada no seu pessoal. Sua saída nunca foi esclarecida pelo governo com transparência.

Sérgio Moro foi responsável pelas decisões judiciais mais emblemáticas da história do Brasil. Conduziu com pulso a Lava Jato que, seria redundante de minha parte tecer o que ela representou para o nosso país enquanto nação. Não vejo Sérgio Moro com desconfiança. Não vou apagar a sua história como juiz e tudo que ele fez da minha memória, e muito menos incentivar ataques à sua pessoa. Não sou juiz para julgar ninguém publicamente. Tem muitas pessoas que se aproveitam da popularidade momentânea de uma desavença entre o Bolsonaro e alguém para se promover nas redes sociais, ganhar seguidores e likes. Esse é o lado mesquinho do atual momento político do Brasil. É a espuma do processo. Isso não é do meu perfil. Critico baseado em fatos reais e nas conclusões que tiro a partir desses fatos.

Para ele, governo não encontrou seu rumo (Foto: Jailson Soares/PoliticaDinamica.com)

PD - A corrupção continua forte no país?

FS - Agora, tirando toda essa espuma, como falei, existem problemas graves no Brasil. Velhos problemas nunca resolvidos e novos problemas. A corrupção continua muito intensa no país e o pós-pandemia vai revelar isso. Temos uma questão econômica para resolver e não podemos ficar esperando todas as soluções através do Governo Federal. Vejo que o prefeito Firmino Filho e o governador Wellington Dias, por exemplo, ainda não trataram de um plano de recuperação da economia local e regional. Não chamaram a iniciativa privada para o diálogo. Deveriam chamar e traçar um plano de recuperação da economia regional. Vem sempre uma pergunta: e quando tudo isso acabar? Não vi, até agora, nenhuma mensagem de futuro desses governantes. Nenhuma mensagem de esperança. Essa geração de políticos falhou no combate à corrupção, no acompanhar das mudanças sociais, na inovação tecnológica, falharam nos desafios que enfrentaram no passado e estão dando sinais que falham no presente.

Comente aqui