CARTÓRIOS CRIMINOSOS

Corregedoria do TJ tem a difícil missão de fiscalizar os cartórios do Estado. (Foto: Divulgação)

por Francicleiton Cardoso e Viviane Menegazzo 

Os problemas de cartório no Piauí são maiores e mais misteriosos do que se pode imaginar. As últimas notícias envolvendo o cartório Naila Bucar (2º Oficio de Notas e Registros de Teresina), que teve a tabeliã destituída do cargo por sonegação de mais de R$ 23 milhões nos últimos 5 anos, além de outras irregularidades, abriu a discussão sobre o problema do concurso público para a área e do gerenciamento destes serviços, essenciais para a sociedade.

Toda a história, que tem rendido pautas na Câmara Municipal de Teresina e no Tribunal de Justiça do Estado do Piauí, ainda está no início e promete dar o que falar. Acontece que, o concurso público realizado em 2013 nunca foi colocado em prática por diversas irregularidades, o que prejudica diretamente o sistema. A vereadora Graça Amorim (PMN) é uma das parlamentares que têm dado ênfase à questão. Segundo ela, há formas de garantir celeridade na aplicação do concurso. Alguns problemas, no entanto, não têm deixado o processo, que agora corre no Supremo Tribunal Federal, chegar ao final.

Vereadora tem cobrado celeridade no resultado do concurso dos cartórios. (Foto: Jailson Soares / PolíticaDinâmica.com)

“Como o edital não previa o número máximo de títulos, os candidatos apresentaram diplomas, no mínimo suspeitos, porque alguns apresentavam 10 diplomas de especialização feitos em 1 ano. Na mudança, o TJ-PI admite apenas dois diplomas de especialização, dois de mestrado e dois de doutorado”, explica a vereadora sobre o problema, que levou à judicialização do certame.

LENTIDÃO BUROCRÁTICA DO JUDICIÁRIO ABRE AS PORTAS DA CORRUPÇÃO

No fim do mês passado, a decisão do desembargador Sebastião Ribeiro Martins, corregedor-geral de Justiça do Piauí, afastando a interina do cartório Naila Bucar, reascendeu a discussão sobre a posse de titulares que passaram no concurso, mas o problema deve se arrastar até uma decisão da justiça. Enquanto isso, não só o cartório do 2º Ofício de Teresina, mas vários outros pelo estado passam por este tipo de problemas.

“Nós temos diversos outros cartórios com problemas semelhantes e estamos trabalhando nisso. O desembargador Sebastião, muito embora já tenham vindo à corregedoria perto do final da administração, vários processos já estão em andamento e em fase de decisão. Há sim outros casos parecidos e que nós temos feito o possível dentro do período”, afirma o juiz auxiliar da Corregedoria do Tribunal de Justiça do Piauí, José Airton.

Juiz auxiliar da Corregedoria do TJ admite que há vários cartórios com problemas no Estado. (Foto: Jailson Soares / PolíticaDinâmica.com)

O juiz admite ainda que há dificuldades estruturais da própria Corregedoria que dificultam a fiscalização de cartórios pelo estado, o que pode ser um fator desencadeante dos problemas encontrados nos serviços prestados. No entanto, Airton defende que não só a Corregedoria, como os próprios cartórios precisam ser responsabilizados por má gestão do serviço.

“Nós temos dificuldade de estrutura para fiscalizar todos esses cartórios e fazer cumprir a obrigação. Entretanto, isso é inato do poder público no Brasil. A população precisa compreender que, como os lucros são aferidos aos donos dos cartórios, é a eles que tem que ser debitada a deficiência na prestação dos serviços. A culpa que cabe a Corregedoria é que deveríamos agir mais eficazmente para punir os que não cumprem esta obrigação”, completa Airton.

A verdade é que os problemas estão resumidos na forma como os dirigentes tratam atualmente dos cartórios. E, claro, na deficiência de ser finalizado o processo de concurso público. O juiz José Airton explica de maneira clara que as dificuldades são bem focalizadas e que é preciso discutir soluções imediatas para o problema. 

Veja abaixo algumas respostas do juiz que esclarecem melhor os entraves enfrentados no Piauí com o gerenciamento e fiscalização ineficientes dos serviços cartoriais:

Em entrevista, José Airton fala de outras questões importantes sobre cartórios. (Foto: Jailson Soares / PolíticaDinâmica.com)

Política Dinâmica: Qual a relação entre os cartórios e o Tribunal de Justiça? A população depende muito, mas não entende bem o funcionamento destas instituições, como o senhor explicaria?

Juiz José Airton: O cartório é uma atividade pública desempenhada por um particular. Como é por exemplo a empresa de ônibus que se usa em Teresina. Tiradas as diferenças mínimas, grosso modo é a mesma coisa. É um serviço público, que o poder público não explora por ele mesmo e ele concede ao particular. Tal qual a empresa de ônibus contrata um motorista que saiba dirigir, contrata o seu apoio, o dono do cartório é obrigado da mesma forma a ter uma quantidade de pessoas adequada. Como há a fiscalização dos ônibus pelo poder público, no Tribunal de Justiça, é a Corregedoria que é responsável por fiscalizar os cartórios.

José Airton conta o porquê do afastamento de tabeliã e fala da polêmica. (Foto: Jailson Soares / PolíticaDinâmica.com)

PD: O afastamento da tabeliã do cartório Naila Bucar se deu exatamente por que?

JA: Preciso esclarecer que o afastamento não se dá por deficiência em serviços prestados. Se deu por outro motivo, que foi em razão do não repasse de valores que teriam que ser repassados ao Tribunal e não foi feito.


PD: Quais os outros problemas encontrados em cartórios espalhados pelo Piauí?

JA: Nós temos problemas distintos em regiões distintas e cartório também tem atribuição diferente. Por exemplo, temos problemas em cartórios de Teresina de registro civil. Eles arrecadam bem menos e reclamam que não tem recursos para prestar serviços melhores e enfrentamos esse problema e somos até obrigados a reconhecer a arrecadação que não é significativa. Daí nós vamos para o Sul do estado do Piauí, onde cartórios são utilizados para a prática de hábitos indevidos relativos à imóveis. É um problema mais grave, porque diz respeito à própria falsificação de documentos. Dependendo da natureza do serviço do cartório e de onde ele é instalado, os problemas se distinguem.

Concurso é solução viável para problemas de cartórios no Piauí. (Foto: Jailson Soares / PolíticaDinâmica.com)

PD: Como a Corregedoria tem visto o problema do concurso dos cartórios no Piauí?

JA: Não que as pessoas que exercem atualmente o cargo nos cartórios não tenham competência, não é isso. Mas a conclusão do concurso é visto pela Corregedoria como solução de diversos problemas nossos. Grande parte dos problemas vem do fato das pessoas que se encontram explorando os cartórios, elas vão sair quando concluir o concurso. Isso desestimula elas a investirem na melhoria dos cartórios, já que vão sair quando tiver o concurso. O concurso é uma medida salutar e uma solução para 70% a 80% dos nossos problemas. 

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