O CAPIM COMEU A VACA!

Não sou de escrever em primeira pessoa, mas me pareceu o mais correto.

Minha filha sempre escolhe a música que toca no carro quando estamos juntos. Da última vez que passeamos, ela pediu a mesma música que já tocava o mês inteiro. Eu disse que dessa vez eu, o pai, mais velho e dono do carro iria escolher a canção. Ela olhou para mim, como se fosse um absurdo e, ironicamente, me disse sorrindo: “Agora o capim tá comendo a vaca!”.

É, escutei isso de uma menina de 5 anos.

Lembrei dessa situação quando vi na manhã desta terça-feira (18) o governador Wellington Dias (PT) e uma comitiva de deputados, secretários, ex-secretários candidatos ao cargo de deputado e aspones no Ministério Público do Piauí. Uma dúzia de suspeitos das mais variadas pastas do governo unidos pela mesma fonte de recursos públicos e o interesse de fazer o MPPI engavetar operações de investigação de corrupção.

(foto: Facebook)

Mais cedo, uma fonte me avisou que havia um movimento para enfraquecer as investigações e afastar os promotores Rômulo Cordão e Fernando Santos, que as conduzem. Ainda deram-me detalhes sobre a participação de uma pessoa do próprio MPPI, cujo marido faz parte do secretariado de Wellington.

Eu já havia escutado de muita gente do governo que o MPPI tinha certa “rédea”. Buscando desmotivar o jornalismo independente, alegam aqui e ali que o atual procurador-geral Cleandro Moura seria amigo demais do governador para investigá-lo — só ele pode investigar o governador e deputados —, e que ele teria chegado a este cargo por intermédio do deputado federal Assis Carvalho (PT) e aqui haveria uma dívida de gratidão.

Por fim, que haveria uma certa cumplicidade entre MPPI e Estado por conta de uma dívida previdenciária que teria se acumulado na gestão de Cleandro e que a gestão de Wellington teria ajudado a contornar. Ainda bem que, em entrevista ao Política Dinâmica, o procurador-geral disse que nada disso existe. E ainda desmentiu a versão do governador de que a Justiça não autorizou as operações.

A cena de deputados e governador pressionando o Ministério Público, sinceramente, me pareceu patética. Mas a narrativa de que as investigações seriam eleitoreiras serve ao projeto do governo de desqualificar o trabalho independente de procuradores. E infelizmente ganha respaldo comercial em muitos veículos de comunicação.

(foto: Facebook)

Estavam todos lá: o pessoal da Operação Topique — a começar pela deputada Rejane Dias (PT) —, o pessoal da Operação Natureza, o pessoal da Operação Itaorna. O governador ainda disse que era estranho que “nos corredores da Assembleia” parlamentares dissessem que em tal data ocorreria outra operação, que outro disse quem seriam os presos, e que isso seria uma prova de que a movimentação do MPPI foi política. Não disse um nome. Não deu uma data. Não apresentou uma prova. Só despejou uma história que lhe serve como álibi.

Há de se apontar que o caminho de dar aos “corredores da Assembleia” um status de fonte legítima de informação é perigoso para o senhor governador. Se metade das coisas que se fala ali sobre como ele conseguiu apoio da maioria dos deputados for verdade, a próxima operação deveria bater às portas do próprio Palácio de Karnak, tão logo ele apareça por lá.

Na sala onde Wellington leu a carta assinada por ele e sua turma, não havia um pobre. Não havia um cidadão com filhos matriculados em escola pública. Ninguém que dependa do transporte escolar que está atrasado. Nenhuma pessoa que passe por uma ponte sem cabeceiras para ir pra casa. Só gente conhecida de esquemas, esse pessoal com filho estudando na Europa, todo mundo bem nascido, bem casado ou bem chegado.

Wellington falou. Seu líder na Alepi, Francisco Limma, falou. O deputado Fernando Monteiro falou também. Até o deputado Assis Carvalho despejou suas palavras de perseguido nos ouvidos dos presentes. Ofereceram a palavra ao deputado Themístocles Filho, presidente da Alepi. Ele viu que o teatro era tão sem noção, que escolheu o silêncio como o melhor discurso.

Outra observação a ser feita: não é preciso fazer parte de uma “conspiração” contra o governo para saber que haverá gente presa sim. Gente grande. E outras operações devem acontecer, em outras secretarias. Porque é evidente que o esquema de licitações dirigidas tomou conta do Governo do Estado.

A continuar nesse caminho, vamos muito em breve ver bandidos fazendo Boletim de Ocorrência em delegacias acusando as vítimas de terem reagido e impondo a eles algum tipo de risco durante o desempenho do trabalho honesto de roubar.

E é aqui que eu digo: o capim está comendo a vaca!


Vídeo completo de toda a reunião:

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