​“Cuidado com quem chega com a bola de cristal”

Nos últimos dias tenho acompanhado e observado com atenção e preocupação a forma mais que polêmica que qualquer discussão de tese ou assunto tem tomado no Brasil. Discussões essas que tem nas redes sociais dentro do mundo virtual uma ação mais do que “explosiva” e sim danificadora de mentes e mentalidades. Grupos ou indivíduos que em vez de debater ou dialogar sobre teses e pensamentos, desejam abertamente que o “circo pegue fogo”, jogam pólvoras em teses e ideias e pavimentam debates despreparados intelectual e humanamente falando e, protegido pela virtualidade, disseminam ódio social capaz de romper com as barreiras da teoria, impulsionando práticas de exaltados e quase terroristas.

Tem muita gente se aproveitando da “fama anônima” das redes sociais para mostrar uma “valentia”, “coragem”, “senso de justiça” que de fato não existe quando observamos em vida prática deste indivíduo. Cito assim o clássico “Homem Invisível”, de Ralph Ellison, que no seu belo romance cita numa passagem que “A irresponsabilidade é parte de minha invisibilidade. De qualquer jeito que a encare é uma negação. Mas por quem posso ser responsável e por que deveria ser, se você se recusa a me ver?” Nesta obra Ralph Ellison mostra a crueldade do racismo, aqui o cito para mostrar a crueldade de quem quer influenciar sem admitir a influência, agindo sem princípio e sem assumir socialmente e fora do mundo virtual sua posição.

Montaigne afirmou certa vez que “Quando alguém me contesta, desperta minha atenção e não minha raiva. Vou ao encontro do homem que me contradiz, que me instrui. A causa da verdade deveria ser a coisa comum para ambos.” Essa afirmação de Montaigne me faz pensar o quanto poderíamos ser melhores, como iríamos contribuir para que as pessoas não tivessem apenas citações ou uma simples peça de retórica, da retórica de nossos interesses e sim uma honesta provocação de pensamentos e reflexão.

Submersos nos rótulos, definimos as pessoas não pela justificativa de suas teses, pelos argumentos e diálogo, definimos as pessoas pelos “clichês” tão valorizados nesta época de raciocínios rápidos, supérfluos, vazios e escondidos no deletar das conveniências humanas.

Racismo, intolerância, machismo, redução de maioridade penal, corrupção, homofobia. O que não falta são temas, alguns com a idade da nossa própria história, outros com a crueldade do próprio tema em si. Muitos são os que se aproveitam e querem para si uma parcela humana eleitoral das cobaias manipuladas para um debate que não visa pela forma à solução do problema e sim a disseminação do ódio. Me parece que de forma organizada uma rede de manipulação de pensamento é implantada a cada semana, mentiras viram verdades e verdades são deturpadas de acordo com os interesses criando sobre as mentes uma cortina de fumaça para compreender o fato em si.

Me lembro bem do filme “A Origem”, em que um grupo especializado em roubar ideias da mente dos indivíduos parte para sua mais difícil missão que é mais do que roubar uma idéia e sim implantar uma nova e original idéia, para que assim a manipulação seja melhor. Isso é o que vejo “porta vozes” da sociedade fazerem com o nosso senso comum, com uma sociedade que se acostumou a achar que pensa com o pensamento dos outros. Grupos de direita e esquerda, religiosos ou não, buscam em suas disputas de poder e moralidade visando apenas o controle dos indivíduos.

O caminho para aqueles que querem pensar, chegar a conclusões de forma segura é ainda respirar forte, estudar muito, penetrar um pouco em si mesmo e de repente fazer como Kant que disse: “É preferível fazer algumas das perguntas do que saber todas as respostas.” Cuidado com aqueles que chegam com a bola de cristal, seja sobretudo você mesmo, pois no final, por mais influência e manipulação que possam existir, a decisão é sua. 

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