ARTIGO: Da boa fé e do dever de renegociar contratos de locação em tempos de pandemia

Por Filipe Mendes 


É incontestável que nem o ordenamento jurídico brasileiro e nem o ordenamento jurídico comparado estavam preparados para os efeitos de uma pandemia na economia, impactando na segurança jurídica dos contratos e na boa-fé, e por isso, praticamente todos os ramos do direito estão sendo atingidos, não existindo respostas prontas para muitos dos questionamentos que vem sendo feitos, não sendo diferente com o instituto das locações, principalmente no que concernem as locações não residenciais/comerciais.

Isso porque os dispositivos legais que regem as locações, principalmente a lei n° 8.245/91 não preveem sobre como agir em períodos tão extremos. 

Na forma do Art. 422 do Código Civil “os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé.”

Em virtude da referida previsão, surgiu o que se conceituou de dever geral de renegociação dos contratos. Ou seja, cabem às partes tentar resolver amigavelmente seus conflitos antes de ingresso no Poder Judiciário, sob pena de verem indeferidos seus pleitos de redução e/ou parcelamento de aluguel, ou até mesmo das cobranças do alugueis estabelecidos contratualmente.

Inicialmente, quanto ao cumprimento das obrigações nas relações locatícias, mesmo em tempo de pandemia, por absoluta ausência de previsão legal, somos levados a pensar na velha máxima do Pacta sunt servanda, princípio que rege a obrigatoriedade dos contratos na forma como o mesmo foi estipulado.

Entretanto, na realidade fática em que vivemos, cada situação deve ser analisada de acordo com suas peculiaridades.

Isso porque, enquanto supermercados estão faturando em média 20% a 30% a mais, e farmácias aumentaram o faturamento em torno de 15%, muitos empreendedores estão impedidos de funcionar em virtude de decretos estaduais e municipais, tendo reduzido bastante seu faturamento, ou até mesmo chegando a faturamento zero, em virtude da impossibilidade de utilização do bem locado para exercício de sua atividade comercial.

Ocorre que o locador, por outro lado, também fica impossibilitado de fruir e dispor livremente do seu imóvel, enquanto o bem permanece à disposição do locatário pelo período de tempo estabelecido em contrato, tendo tolhido seu direito a posse direta do bem, e por isso,  tem por direito o recebimento de remuneração.

Dessa forma, em virtude da ausência de previsão legal até o momento, recomenda-se antes do ingresso com demandas judiciais, a negociação entre as partes, sob pena de não acolhimento da pretensão pelo Poder Judiciário.

Importante que as partes estejam bem orientadas juridicamente, instruídas por advogados com expertise no direito imobiliário, a fim de minorar o risco de repactuações desvantajosas/prejudiciais, vez que após as mesmas, já feitas sob o novo cenário, haverá necessidade de cumprimento integral do que foi livremente acordado.

 Filipe Mendes de Oliveira
Advogado OAB/PI n° 12.321.
Especialista em direito processual pela Universidade Federal do Piauí
Especializando em direito imobiliário pela UNISC
Especializando em direito de família pela ESA/PI.
Coautor do livro “O PROCESSO E OS IMPASSES DA LEGALIDADE”

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