Da arte de não dizer nada falando sobre tudo e/ou vice-versa

O mundo tá louco. Alguém tem dúvida? Com certeza você já ouviu falar por aí que as coisas estão com o valor invertido? Ou que as pessoas perderam as referências morais e éticas. “É falta de Deus no coração!”, diria alguém mais religioso.

Ué, mas os militantes ou militares do Estado Islâmico não matam as crianças cristãs em nome de Deus. Ou melhor, de Alá. Mas dá no mesmo. O criador universal que resume a força capaz de congregar o tudo, o todo e o nada. O alfa, o beta e o ômega. Onipresente, onisciente e onipotente. Olha, se for assim, talvez esteja praticando a indolência e deu um tempo para si mesmo, cansado da onisciência. Quem sabe trancou-se em seu escritório e está assistindo a um Big Brother menos previsível ou jogando Champions League no PS4 e não quer ser incomodado com onipresença nenhuma. Ou então está depressivo, com sentimento de culpa por ter exagerado na dose ao nos ceder o livre arbítrio e não pode fazer mais nada por sua criação, sentindo-se impotente, com insônia mesmo com superdosagem de rivotril.

Criatura, antes que me chamem de herege, peço minha clemência, a Ele. Com você eu estou pouco me importando. Não é assim que as coisas andam? Ninguém se importa com ninguém e o egoísmo reside em corações e mentes da maioria dos 7 bilhões de terráqueos. “Nossa, quanta falta de esperança na humanidade”, é só o que vejo quando postam os absurdos do comportamento humano na redes sociais. Então não sou apenas eu que posso estar desesperançado. Você também está. Admita.

Mas, por falar em redes sociais, você lembra quando foi que postou alguma cena que não mostre o lado sombrio, obtuso, ridículo, bizarro, abominável, perverso, corrupto, desumano de algum ser humano sendo o pior exemplo, no facebook? Demorou para responder? Então você também faz parte dessa máquina de moer a nós mesmos. Ninguém tem culpa de nada ou a culpa é dos outros? Imagina, somos todos inocentes. Somos o resultado do suco pisado no lagar e fermentado nas adegas. Vinho inebriante que deveria ficar melhor quanto mais velho. Porém, por vezes, viramos vinagre. Delirium tremens. Chupa que é de uva!

Algum mutante de ressaca diria: “mas eu nem tenho facebook”. Tá bom! Pois você não existe, queridinho(a). Se não tem, vai ter. E mesmo que nunca tenha, vai falar mal da criação genial do Mark Zuckerberg – o primeiro a ser bilionário (em dólares) da história antes dos 30 anos. E não tendo e falando mal, ainda assim está no jogo de querer se comunicar.

Eis o grande lance: nós temos a pulsante necessidade de dizer, compartilhar comentar, curtir (muitas vezes pela pura falsidade, curtir da cara dos outros ou de nós mesmos). Precisamos espalhar aos quatros ventos, direcionado a todos os pontos cardeais, a rosa dos ventos bons e ruins, o que somos, o que não somos, o que gostaríamos de ser, o que pretendemos ser e o que fingimos que somos. Afinal, ter ou parecer ter é muito mais importante do que ser. Pelo menos é o que parece quando clica-se na social media. E que média se faz por aí, por ali e por acolá. Somos o meio, a mensagem, o carteiro, o selo, o e-mail, o ruído, o muído e o feedback. “I’ll be back!”.

No instagram, a rede social mais vaidosa de todas, mostramos o quanto somos exibicionistas. “É que Narciso acha feio o que não é espelho”, canta Caetano Veloso, em Sampa, mas transfere-se alhures. Um prato de comida très chic, mesmo não sendo francesa, está sempre no cardápio de publicações. Já viu alguém publicando foto de prato de feijão com arroz e pequi? Claro que sim! Pra ironizar, para satirizar, ou só pra fazer inveja.

É muita viagem. Sim, se viajamos, temos que postar o mar, deitado na rede com um copo de cerveja bem geladinha, uma selfie ou belfie na academia, com a estátua da Liberdade compondo o fundo, o beijo na torre Eiffel, de braços abertos com o Cristo Redentor, o por do sol na mureta do encontro dos rios ou as nuvens através da janelinha do avião. Livres. É pra isso que usamos nosso direito de ir e vir e expor o look do dia. O que é e o que não é de interesse público, pouco importa. Precisamos alardear, ostentar qualquer coisinha ou coisona. Temos que ser vistos, ditos e escritos, falados, nunca calados.

Já o twitter está em baixa. O site do passarinho só tem intelectual? “Gente que só quer ser”, supõem ou maldizem os que nunca foram, mas gostariam de ser. Para lá estar, o popstar ou a subcelebridade tem que ter o poder de síntese, da tese e da antítese, e de escrever com 140 caracteres, no máximo. Realmente, pra poucos, pouquíssimos – o mínimo. Quase abandonado, sobraram uns com a coragem ou inocência de apresentar suas ideias e impressões das acontecências. Ou então, inconsequentes. Disso temos medo. Das pessoas terem argumentos para contestar o que dizemos. Ou usarem o que dissemos contra nós.

Mas é lá que se dá notícia em primeira mão de um tudo o que acontece no mundo. Inclusive dos boatos. O Larry tomou para si o protagonismo da notícia há anos e o furo de reportagem quase abandonou os portais. Jornal, tadinho, é um ancião, às pândegas. Senil e de muletas, ainda quer ser dono das letras. Aliás, o impresso ainda existe, ou melhor, resiste. E tem quem queira comprar e sujar as mãos de tinta por manchetes que saem atrasadas, levando em conta o quase instantâneo poder dos sites de notícias de mostrar o que acontece em tempo real – às vezes com algum delay, mas pouco. E o whastapp? Alguém ainda sobrevive sem ele? Ah internet! O que fizeste de nós?Os aldeões globais de Mcluhan?

É muita água para um texto só. Quem dera. Água é cada vez mais preciosa. E não é o caso. Pode não parecer, mas tenho “simancol”, às vezes. É sede mesmo. Secura por dizer um monte de asneiras, besteiras e algumas certeiras. Quem sabe um elixir do existir.

Estou chegando. Bem feliz e agradecido pelo espaço cedido. Aqui vou deitar e rolar. Escorregar e patinar. Pintar o sete e bordar o 8 (today). Vou escrever sobre tudo o que der na telha. De criação a política. De literatura ao cinema. De filmes aos livros. De amor e da falta dele. Do que tiver nexo, sexo, complexo e do que também não rima. Em verso e prosa vou usar o meu direito de cometer o erro de ser um autêntico outsider em busca de encaixe nesse quebra-cabeças que embaralha todo dia.

E de já me absolvo e rogo arquivamento por falta de provas. Você será minha testemunha do direito de não ficar calado. Só não quero que saia ileso, se ler. Que cause conforto ou desconforto. Que chore ou ria. Que me ache bobo ou esperto. Tanto faz. A indiferença é que dói. E sabe o que posso ganhar com tudo isso? Absolutamente nada! Também sei que não há nada a perder. Se gostar, espalhe. Se não gostar, fale mal, mas, fale. Por favor!

Como hoje é o Dia Internacional da Mulher, não poderia deixar barato e preciso dizer o quanto valorizo a porção feminina (que é lésbica) que trago em mim. E mais ainda as que são de corpo, alma e coração: da ternura, da candura, das vingativas, do caos e da harmonia, das incertezas, das belezas, das que põem a mesa, das estrias, das TPMs, das crises existenciais, da dúvida da autoestima, das celulites, das socialites, das que buscam pelo xampu que deixa o cabelo mais belo, das progressivas e inteligentes, das permanentes, das de repente, das compreensivas, das divas, das obsessivas, das intempestivas, das vips e das vipers, das serenas, das amenas, das do lar, das da rua, das nuas, das santas, das castas, das putas, das puras e das nefastas, das donzelas, das de família, das órfãs, das cidadãs, das que hoje estão para o crime, das elegantes, das falantes, das ladys, das princesas, das rainhas, das patricinhas, das nobres e das plebeias, das fofas e das teteias, das bondosas e das gostosas, das maldosas, das generosas, das famosas, das faladas e das rodadas, das enroladas, das tímidas e das temidas, das cachorras, das gatas, das sapas, das Amélias, das Camélias, das Ofélias, das Capitus, das Genis, das gentis, das que cedem a barriga de aluguel, das que são doce como o mel, das que são o puro fel, das mães que parem com dor e das que se cortam nas cesarianas por amor, das manas, das vovós, das bisa, das sós, das que não descem do salto, das bailarinas, das meninas, das malinas, das fadas e das safadas, das elegantes, das que fazem barraco e das que são dos que têm a sorte ou azar de ser amado ou odiado, mas nunca esquecido.

Vocês são o tempero que dá gosto em viver. Vocês são o sal que lacra a moleira dos impertinentes. A pureza de uma nascente. A ira de um furacão. A bonança depois da tempestade. Um lampião na escuridão. A luz no fim do túnel e do senso que buscamos. O tudo que sonhamos. O anseio e o pesadelo. O prazer que nos faz crescer e a dor de cotovelo. A acolhida do colo protegido que acalma e consola. O leite do seio que jorra e nos torna imunes. O veneno e o antídoto na dose de quem bem merecer. O cheiro de chuva em terra molhada que está pronta a ser semeada.

A Terra é feminina. É Gaia. A lua, também - que determina as marés que nos complementa num indo e vindo infinito. E nem o sol, que parece de gênero oposto, na verdade é estrela que nos ilumina, aquece, faz brotar vida com a centelha de um olhar. Minhas eternas amadas e adoradas, eu as amo, muito! E nem falei em Maria, só no final. Beijo!

Comente aqui