Alice acorda e vai pra rua no país da gasolina

Era uma vez uma menina que se chamava Alice. A garota era uma sonhadora irrecuperável. Vivia no mundo dos devaneios e sonhava acordada em busca de aventuras que dessem mais emoção para a sua vidinha tediosa.

Depois de cansadas aventuras no país das Maravilhas, a mocinha aproveitou que o dólar estava muito barato e resolveu viajar para conhecer outros lugares fantásticos. Aliás, nunca a moeda do Tio Sam tinha ficado tão desvalorizada. Por isso, Alice aproveitou e procurou um lugar em que o dólar tivesse um valor idêntico.

A sonhadora ficou encantada quando começou a ler sobre Petrolândia. Era um país muito diferente. Lá a gasolina era distribuída gratuitamente para os seus cidadãos. E era pura. Purinha. Não tinha nenhuma mistura. Tudo porque a produção era maior do que o consumo. A empresa tinha lucros estratosféricos na exportação que não precisava vender no país. As ações da empresa eram as mais valiosas do mercado e seus administradores eram tão honestos e competentes que sempre sobrava combustível no fim do mês.

Ao desembarcar no país do petróleo, Alice trocou seus dólares por royal, a moeda local. Em seguida, entrou em um táxi verde e amarelo e pediu para dar uma volta pela cidade. Queria conhecer melhor a capital do país mais maravilhoso que botara os pés. Passeando por Petrólia, a garota ficou assustada com um monte de gente fazendo manifestação na rua. As pessoas batiam em panelas, sopravam apitos, estavam com as caras pintadas de preto e gritavam palavras de ordem: “um, dois, três, quatro, um milhão, chega de propina e abaixo o petrolão.”

A moça perguntou ao taxista de barba branca o que era aquele protesto. O motorista, que tinha a voz rouca e problemas de dicção, falou: “companheira, o povo está muito chateado. Ninguém aguenta mais receber gasolina de graça, o petrolão. Muito menos suporta todo fim de mês receber royalties do petróleo, a propina.”

“Mas como?”, indagou Alice ao taxista que tinha seis dedos na mão esquerda. O senhor que se chamava Lala, respondeu: “minha filha, os companheiros estão infelizes porque é tanta gasolina que fica estragando no tanque. Além do mais, não tem com o que gastar com tanto royalties. A saúde pública está perfeita, a educação é a melhor do mundo, os trabalhadores se aposentam com 40 anos e assim ninguém é feliz.”

Alice pediu para descer um instante. Queria conversar com algum manifestante para entender melhor o porquê de tanta revolta. Encontrou um rapaz bem exaltado. Antes dela perguntar alguma coisa, o jovem já entregou uma bandeira que pedia o impeachment da presidêntica. Era assim que a chamavam porque ela tinha os dentes da frente muito pronunciados.

Depois de algum tempo, finalmente a garota conseguiu perguntar: “mas se vocês têm uma boa saúde pública, uma excelente educação, recebem gasolina de graça e propina do petrolão, por que tirar a presidêntica?” Irritado, o rapazinho disse: “porque ela mentiu, prometeu que a gente ia ser feliz e está fazendo tudo ao contrário do que disse.”

Ainda sem entender, Alice retornou ao táxi do Lala e pediu para ser levada a alguém que pudesse explicar melhor toda aquela situação. O taxista pensou um pouco e deu a dica: “hum, já sei. Vou levar você ao sábio palhaço Pururuca, o homem mais sério de Petrolândia, companheira.”

O motorista Lala levou a menina direto ao parlamento, o lugar onde estavam os homens e mulheres mais sábios e honestos de Petrolândia. Alice foi recebida por Pururuca – o palhaço que tinha sido eleito com o slogan “Melhor do que está não dá.” O gaiato parlamentar explicou à garota que tudo o que estava acontecendo era porque o povo estava cansando de receber tudo de graça e não tolerava de forma alguma uma governante que não cumpria a palavra. O povo queria um pouco de sofrimento e tudo o que ela dava era alegria e assim ninguém podia ser feliz.

Mesmo sem entender muita coisa, a mocinha voltou ao táxi e pediu a Lala para levá-la de volta ao aeroporto. Alice não gostou do que viu e estava decepcionada com o país onde as pessoas tinham tudo para serem felizes, mas estavam profundamente tristes e revoltadas. Ao embarcar, a garota notou que ainda tinha um adesivo da manifestação em seu vestido, que mostrava a cara da presidêntica. Acabou por cochilar olhando apara aquela imagem.

Quando acordou, já em casa, o coelhinho vermelho de Alice veio brincar com ela. Foi quando ela notou que o bichinho era a cara da governante de Petrolândia. Mas a menina, que sempre foi esperta, pegou o coelhinho no colo e pensou com os seus botões: “essa foi para eu aprender a nunca trocar coelho por lebre.”

Comente aqui